Lucrécia Bórgia (Subiaco, 18 de abril de 1480 — Ferrara, 24
de junho de 1519) foi a filha ilegítima de Rodrigo Bórgia, importante
personagem espanhol do Renascimento, que viria a se tornar o papa Alexandre VI.
O irmão de Lucrécia foi o conhecido déspota César Bórgia.
Infância
Lucrécia Bórgia nasceu em 18 de abril de 1480, na Comuna de
Subiaco, perto de Roma. Sua mãe era Vannozza dei Cattanei, uma das muitas
amantes do pai de Lucrécia, Rodrigo Borgia, mais conhecido como o Papa
Alexandre VI. Vannozza também deu a Rodrigo os seguintes filhos:
Giovanni Bórgia, duque de Gandía, nascido em 1474.
César Bórgia, nascido em 1475.
Gioffre Bórgia, nascido em 1481 ou 1482.
Quando completou nove anos, Lucrécia foi separada de seus
irmãos: Giovanni seguiu para a Espanha. César viu-se obrigado por Rodrigo a
entrar para a vida religiosa, mesmo sem a menor vocação; e a própria Lucrécia
foi despachada para a casa de Adriana de Mila, dama da nobreza e viúva, a fim
de receber uma educação erudita ao lado da rigorosa senhora.
Casamentos:
Casamento com Giovanni Sforza
Em 26 de fevereiro de 1491, um arranjo matrimonial foi
elaborado entre Lucrécia e o Senhor de Val D'Ayora no Reino de Valência, Don
Cherubino Joan de Centelles, que foi anulado menos de dois meses depois, em
favor de um novo contrato envolvendo Lucrécia e Don Gaspare Aversa, conde de
Procida.1 Quando Rodrigo se tornou Papa (Alexandre VI), procurou aliar-se com
poderosas famílias principescas e dinastias fundadoras da Itália. Para tal, ele
cancelou compromissos anteriores de Lucrécia e arranjou para ela se casar com
Giovanni Sforza, um membro da Casa de Sforza, que era o Senhor de Pesaro e
intitulado Conde de Catignola.2 Giovanni era um filho ilegítimo de Costanzo I
Sforza e um Sforza de segundo grau. Casou-se com Lucrécia em 12 de junho de
1493, em Roma.
O casamento não se consumou, pois a noiva era considerada
jovem demais. Os dois anos que separaram o casamento da consumação, marido e
mulher passaram totalmente afastados, Giovanni Sforza governando Pésaro e
Lucrécia fruindo as orgias nos aposentos de seu pai e de seus irmãos no
Vaticano. Neste meio tempo, Alexandre depõe Giulia Farnese como sua amante
favorita e a expulsa do Vaticano; assim Lucrécia fica sem a amiga. Porém, ela
já arranjaria outra: a nova esposa de seu irmão Geofredo, Sancha de Aragão,
filha bastarda do rei de Nápoles.
“Lucretia de Borgia” em uma carta a sua irmã Isabella
Gonzaga (março de 1519)
Retrato de uma Mulher por Bartolomeo Veneto,
tradicionalmente considerado como de Lucrezia Borgia.
Em pouco tempo, a família Bórgia não precisava mais dos
Sforza, e a presença de Giovanni Sforza na corte papal era supérflua. O Papa
precisava de novas alianças políticas, mais vantajosas, então ele pode ter
secretamente ordenado a execução de Giovanni. A versão geralmente aceite é que
Lucrécia foi informada de tal por seu irmão Cesar, e avisou o marido, que fugiu
de Roma.
Alexandre pediu ao tio de Giovanni, o cardeal Ascanio
Sforza, para convencer Giovanni a concordar com um divórcio. Giovanni recusou e
acusou Lucrécia de incesto paterno e fraterno. O papa afirmou que o casamento
de sua filha não tinha sido consumado e foi, portanto, inválido. A Giovanni foi
oferecido o seu dote em troca de sua cooperação. A família Sforza ameaçou
retirar sua proteção, caso recusasse. Giovanni assinou confissões de impotência
e, finalmente, documentos de anulação perante testemunhas.
Romance com Perotto e o "Infante Romano"
Logo após a morte de Giovanni Sforza, surge outra polémica
familiar, a suposta gravidez de Lucrécia, apesar de esta estar enclausurada em
um convento. Há especulações que durante o processo prolongado da anulação,
Lucrécia consumou um relacionamento com alguém, um jovem espanhol, Pedro (ou
Pero) Calderón, também chamado de Perotto.4 Calderón era da criadagem do papa
Alexandre e era o incumbido de transportar a correspondência entre pai e filha.
O certo é que, por algum tempo, ele realmente foi amante de Lucrécia Bórgia,
mas não há como provar se ele a engravidou ou não. Em todo o caso, as famílias
hostis aos Bórgias viriam a acusá-la de estar grávida quando seu casamento foi
anulado por falta de consumação.
Foi documentado que ao descobrir o romance entre sua irmã e
Pedro, César, desvairado de raiva e de ciúme, o esfaqueou, porém o rapaz
conseguiu chegar aos aposentos do papa e sujou sua batina de sangue. Pedro
Calderón escapou desta vez, mas a sorte não lhe sorriria novamente. Pouco
depois, ele seguiu o destino de Giovanni Sforza, e assim, em fevereiro de 1498,
os corpos de Pedro Calderon, e uma empregada doméstica, Pantasilea, foram
encontrados no Rio Tibre. E o assassino foi também o mesmo de Giovanni: César
Bórgia.
Em março de 1498, o embaixador de Ferrara afirmou que
Lucrécia tinha dado à luz, mas isto foi negado por outras fontes. No entanto,
uma criança nasceu na família Bórgia um ano antes do casamento de Lucrécia com
Alfonso de Aragão. Foi chamado de Giovanni, mas é conhecido pelos historiadores
como o Infante Romano. Em 1501, duas bulas papais foram emitidas sobre esta
criança, Giovanni Bórgia. Na primeira, foi reconhecido como filho de Cesare de
um caso antes de seu casamento. A segunda bula, contraditória, reconheceu-o
como o filho do Papa Alexandre VI. O nome de Lucrécia não é mencionado em
nenhuma delas, e os rumores de que ela era sua mãe nunca foram provados. A
segunda bula foi mantida em segredo por muitos anos, e Giovanni foi assumido
como sendo o filho de Cesar. Após a morte de Alexandre, Giovanni foi viver com
Lucrécia em Ferrara, onde foi recebido como seu meio-irmão.
Casamento com Afonso de Biscegli
Em 17 de junho de 1498, Lucrécia Bórgia desposa Afonso de
Biscegli em uma cerimônia pomposa no Vaticano. No ano seguinte, o Papa
Alexandre VI deu à filha Lucrécia a fortaleza de Nepi e as regiões de Spoleto e
Foligno para que ela governasse.
O casamento foi breve, durando de 1498 até a morte de
Alfonso em 1500. Há indícios que o irmão de Lucrécia, Cesar foi responsável
pela morte de Alfonso, porque já tinha se aliado (por casamento) com a França
contra a Nápoles. Assim, César Bórgia teria posto em ação mais um de seus
planos: o de matar o próprio Afonso de Biscegli. Lucrécia estava grávida agora,
e César conseguiu convencer a irmã e o cunhado a ir ter a criança em Roma, que
nasceu e foi chamado de Rodrigo de Aragão. Em julho de 1500, pouco depois da
chegada do casal, Afonso foi surpreendido por um grupo de homens fortemente
armados que o esperavam na Praça de São Pedro. Ele foi apunhalado, mas
conseguiu fugir até os aposentos de Lucrécia, onde caiu gravemente ferido.
Socorrido imediatamente por sua mulher, Afonso recuperava-se. Lucrécia e sua
cunhada, Sancha de Aragão, cuidavam de Biscegli e, com medo de envenenamento,
elas próprias faziam a comida do duque. Porém, numa noite de descuido de
Lucrécia e Sancha, um criado (Michelotto Corella - primo dos Bórgia, homem de
confiança do papa e de César - entrou sorrateiramente nos aposentos de Afonso enforcou-o.
Casamento com Afonso D'Este
Após sua controversa regência, Lucrécia recolheu-se na
fortaleza de Nepi com seu filho Rodrigo e Giovanni Bórgia (Infante Romano).
Entretanto, seu pai e seu irmão arranjavam mais um casamento para ela. Desta
vez, o alvo da família Bórgia era o filho do poderoso duque de Ferrara, o jovem
Afonso d´Este Lucrécia tinha 22 anos e Afonso d´Este 25. O casamento foi
confirmado, e realizado em 30 de dezembro de 1501, sem a presença do noivo, em
cerimônia simples no Vaticano. Em 2 de fevereiro do ano seguinte, Lucrécia
entra triunfalmente em Ferrara. Como dote, foram pagos aos D'Este duzentos mil
ducados, apesar da proposta inicial do noivo ter sido de 300.000. Comparando
aos 15.000 ducados pagos a Giovanni Sforza, o primeiro marido de Lucrécia,
alguns anos antes, a diferença é formidável. Mas há uma explicação muito
simples. Lucrécia Bórgia, na época uma menina de treze anos, não tinha nenhuma
mácula em seu nome. Mas agora, aos olhos de toda a Europa, ela era envenenadora
e incestuosa. Lucrécia nunca mais tornaria a ver Alexandre VI, mas não se
livraria do irmão César.
Ela deu ao seu terceiro marido muitos filhos e provou ser
uma respeitável e realizada duquesa da Renascença, efetivamente elevando-se
acima da sua reputação anterior e sobrevivendo a queda dos Bórgias, após a
morte de seu pai. A nenhum parceiro foi fiel: iniciando em 1503, Lucrécia teve
um longo relacionamento com seu cunhado, Francesco II Gonzaga, Marquês de
Mântua, bem como uma relação amorosa com o poeta Pietro Bembo. A esposa de
Francesco era a culta intelectual Isabella d'Este, a irmã de Afonso, para quem
Lucrécia fizera insinuação de amizade sem sucesso. O caso entre Francesco e
Lucrécia era apaixonado, mais sexual do que sentimental, como pode ser comprovado
nas cartas febris de amor que o casal escrevia um ao outro. O caso terminou
quando Francesco contraiu sífilis.
Em 1503, o Papa Alexandre morreu, e com a eleição do Papa
Júlio II, César viu seus planos totalmente arruinados. César casou-se com a princesa
Charlotte de Albret, ganhou o título de duque de Valentinois, e entrou para a
história como ´Duque Valentino´. Foi imortalizado por Maquiavel em sua obra
prima, O Príncipe, que tomava César Bórgia como o exemplo de bom governante e
habilidade política. César foi morto em 1507, lutando pela França, em uma
emboscada na Espanha.
Papisa
Em 1501, o papa passou algumas semanas em Nápoles, recém
conquistada pelos Franceses. O mais convencional, seria deixar um cardeal de
confiança do papa em sua ausência para tomar as rédeas do Vaticano. Mas
Alexandre VI escandalizou a Europa com uma escolha inédita: durante sua viagem,
a papisa[carece de fontes] seria sua filha Lucrécia Bórgia. O ato totalmente
inédito na história do papado, provocou uma fúria explicável no renomado
Colégio dos Cardeais.
Vale lembrar que não basta estar a frente do governo
temporal de Roma para ser considerado papa ou papisa.
Duquesa de Ferrara
Voltando a Lucrécia, ela engravidou em 1503. Mas acabou por
contrair malária, e seu médico teve de abortar a criança para não pôr a vida de
Lucrécia em perigo. Com a morte do sogro em 1505, ela e marido foram nomeados
duques de Ferrara. No mesmo ano, deu à luz o primeiro rebento do casal, Afonso.
A criança morreu semanas depois, mas três anos depois o casal ducal foi
presenteado com outro menino, Hércules. Depois deste, vieram outros filhos:
Hipólito (1509), Francesco (1516), Alexandre (1514), Eleanora (1515), e Isabel
Maria (1519). Ela foi boa mãe para todos os seus filhos, inclusive para os que
estavam longe dela, como Rodrigo e o misterioso Giovanni, "O Infante
Romano". Sabe-se que Rodrigo morreu em 1512, aos treze anos de idade,
fazendo Lucrécia Bórgia sofrer e se recolher em um convento por algum tempo;
mas quanto ao "Infante Romano", apenas se sabe que ele morreu em
1548, tornou-se duque de Spoleto, mas morreu relativamente esquecido e com
pouco status de neto de papa, ou filho de Lucrécia Bórgia. Sua linhagem é
totalmente desconhecida.
A primeira vez que Lucrécia ficou como regente em Ferrara
foi um ano após sua nomeação como duquesa. Ela aproveitou a oportunidade para
mostrar outra simpatia comum de sua família: a vontade de ajudar o povo judeu,
ao criar um édito proibindo terminantemente qualquer tipo de discriminação
contra eles. Lucrécia em Ferrara formou a chamada "Corte das Letras":
incluía escritores como Ludovico Ariosto (que dedicou-lhe "Orlando
Furioso"), Pedro Bembo (que definiu o seu amor por Lucrécia Bórgia como
´platônico´) e Hércules Strozzi, da poderosa família Strozzi, assassinado por
Afonso d´Este pelo ciúme que ele sentia do literato com Lucrécia. Sua corte
também reunia pintores como Ticiano e Venetto, entre outros. Em 1508, Lucrécia
recebe o humanista Erasmo de Roterdã em sua corte. Em 1506, ficou como regente
de Ferrara durante a ausência do marido, embora estivesse sob a vigilância de
seu cunhado, o cardeal Hipólito. Apesar das constantes infidelidades do marido,
- ele, após a morte de Lucrecia Bórgia, juntou-se a Laura Dianti, uma de suas
amantes, que viveu como Duquesa de Ferrara apesar de nunca terem se casado
formalmente - Lucrécia foi feliz com Afonso d`Este.
Como uma Bórgia, Lucrécia guardava algum rancor do Papa
Júlio II (Giuliano della Rovere). Afinal, ele havia sido inimigo ferrenho de
seu pai e traído seu irmão. Então, ela se jubilou quando Ferrara entrou em
guerra contra o papa em 1511, e mais ainda quando a venceu. Comemorou mais
ainda quando o papa Júlio morreu, e quem assumiu o trono papal foi Giovanni de
Médici, que adotou o nome de Leão X. Afinal, a Médici sempre foi aliada dos
Bórgias. Inclusive o novo papa havia sido muito amigo de seu irmão César nos
tempos em que ambos cursavam a Universidade de Pisa.
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